A controversa aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor em Fundos de Investimento

Ainda que a Súmula 297 do STJ venha buscando reconhecer a incidência do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em fundos de investimento, o tema é, sem dúvidas, controverso. Por isso, as jurisprudências existentes não são uniformes, ou seja, encontramos casos em que se aplicou o CDC aos fundos e outros que não.

É fato que a Súmula deixa claro que o CDC é aplicável às instituições financeiras, e é nesta ótica que se deve entender a diferença entre instituições financeiras, fundos de investimentos e seus prestadores de serviços essenciais. A dificuldade reside justamente nesta distinção, o que faz com que não tenhamos, até hoje, um entendimento pacificado sobre o assunto.

Para compreender se haverá aplicação do CDC, é preciso, antes de tudo, entender (i) os fundos de investimentos e os papéis dos gestores, administradores e cotistas; (ii) o regime jurídico consumerista, que trata de relações econômicas de consumo que envolvem a utilização de bens e serviços para atender as necessidades imediatas do consumidor; e (iii) o regime jurídico dos fundos de investimento, que regula esta comunhão de recursos, constituída sob a forma de condomínio especial, destinados à aplicação em ativos financeiros e à consequente rentabilidade destes.

Uma relação de consumo é caracterizada quando constatado:

1. Que há vulnerabilidade do consumidor;

2. Que o consumidor é o destinatário final do produto ou serviço; e

3. Que há definição clara de fornecedor – e aqui reside a importante distinção dos prestadores de serviços essenciais dos fundos (administrador e gestor), dos seus papéis (de fornecedores ou não) e da possibilidade de equiparação às instituições financeiras.


Ao analisar os fundos de investimento, salvo entendimentos contrários, tais requisitos não são preenchidos. Isso porque o investidor não possui características de consumidor, já que, além de não ser parte vulnerável, ele também não é o destinatário final no sentido que o CDC pressupõe.


E soma-se a isso que administradores e gestores atuam em um ambiente regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), com normas próprias que protegem a todos de maneira distinta das relações de consumo, tendo regras claras, específicas e especiais, inclusive visando à proteção dos cotistas.

Em suma, deve-se analisar o tipo da relação em questão e entender os conceitos técnicos para decidir pela aplicação ou não do CDC ao caso concreto. Neste sentido, salvo melhor juízo, não se pode tratar fundos de investimento como instituições financeiras por analogia, pois os pilares destas relações são diversos e cada uma deve ser estudada em sua seara à luz de regras próprias.

A utilização indiscriminada da Súmula 297 do STJ e de jurisprudências que aplicam o CDC aos fundos de investimento pode não ser a via mais adequada, dado que o simples envolvimento de uma instituição financeira não deve ser suficiente para concluir por tal aplicação.

Por certo, encontramos muita discussão sobre o tipo de cotista, conhecimento, o que seria meio e fim e quem seria o prestador e o fornecedor de serviço. É em razão de todas essas nuances que existem leis específicas para cada caso, isto é, leis que objetivam tratar de forma mais isonômica situações que naturalmente diferem entre si.

É preciso esclarecer, debater, entender conceitos e definições para tratar dos litígios envolvendo fundos de investimento. A aplicação ou não do CDC em sua esfera é apenas um dos vários questionamentos que temos sobre o tema no judiciário.

Somente o amplo e técnico conhecimento reduzirá controvérsias deste tipo e, sendo uma discussão que permanece em aberto, conhecer e sistematizar as decisões judiciais é essencial para que todas as partes interessadas recebam a melhor orientação.

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